sexta-feira, 2 de setembro de 2016

AVENTURA NO RIO TROMBETAS - PARÁ















Rio Trombetas no Pará. Um velho sonho de um pescador em busca dos gigantes tucunarés de que havia notícias da região. Sem qualquer informação de apoio à esse tipo de pescaria, a Aruanã conseguiu tornar o sonho realidade com o apoio de grandes empresas. Finalmente conseguimos fazer essa aventura, que começou a partir de Santarém.










Souza Junior: a “nave mãe”.                                             
                                                   1º Dia – 23/10/1987
Saímos de Santarém a bordo do Souza Júnior, um “motor” típico da região amazônica. O cais do porto de Santarém fica no rio Tapajós. A mais ou menos 1 km, passa o rio Amazonas. Começamos a subida para o rio Trombetas por volta das 17h, e a velocidade do “motor” era de mais ou menos 25 km/hora. Este barco é firme e mede aproximadamente 20m. Além de cabines, há alguns camarotes e seu motor é um Mercedes 156 HP. No convés, há diversas cadeiras, mesas, geladeiras e freezers. Durante o trajeto, nós, e os tripulantes, fomos batendo longos papos e travávamos conhecimento com a região. A água do rio Amazonas é turva, bem diferente do rio Tapajós, que é cristalina. Entre uma cerveja e outra, começou a escurecer. Hora da janta: foi servida uma canja e um caldo de mocotó. As redes foram armadas no convés, já que nesta região, devido ao calor, é muito mais confortável dormir nelas. Embalados pelo balanço do barco e pelo ruído do motor, adormecemos, nesta primeira noite de nossa aventura. Passamos por locais como Paricatuba, Guajará, Ilha da Marimarituba. Boca do Lago, Costa de Óbitos e Óbitos (chamado “a garganta do rio Amazonas”). O capitão do barco, Salomão, estava firme no timão. Acordamos por volta das 6h. Já havíamos navegado 13 horas, subindo o rio.
                                            

Praias formadas nos lagos do rio. 

Por volta das 7 horas, chegávamos a uma cidade de nome Oriximiná. Paramos na cidade para conhecer e dar uma volta, principalmente no mercado local. Uma preta paraense nos serviu, em uma cuia, um mingau de arroz e tapioca, de sabor agradável e doce, foi nosso desjejum. Voltamos então ao Souza Junior e retornamos a marcha em direção ao “tabuleiro”, nossa meta final no rio Trombetas. No caminho passamos por uma usina de bauxita. Alguns quilômetros acima, na entrada de um lago, chegamos a um posto do IBDF. O fiscal subiu a bordo, e, após uma rápida vistoria, “liberou” nossa embarcação. Após uma reunião rápida, resolvemos bater esse lago, que – segundo o pessoal ribeirinho – era muito bom de tucunarés. Almoçamos, e depois do descanso, saímos para pescar no sistema de corrico. Pegamos diversos tucunarés, e tivemos a oportunidade de avistar diversos botos cor-de-rosa, fazendo evoluções na água. Jacarés, aves e uma mata maravilhosa compunham nossa paisagem. Pescamos até às 18 horas, já que era nossa intenção jantar no barco e seguir viagem à noite, rumo ao tabuleiro. Já era noite quando começamos voltar ao barco. Para se ter uma idéia do tamanho desse lago onde pescávamos, podemos dizer que durante esse tempo todo, não batemos nem 10% de sua área total. São alguns milhares de hectares, pontuados por centenas de ilhas, muito semelhantes entre si.






Tucunaré fisgado no sistema de corrico.  

Assim sendo, e no escuro, foi inevitável que nos perdêssemos. Das 19 às 22 h, ficamos vagando, tentando encontrar o caminho. Decorrido esse tempo, e cada vez sabendo menos onde estávamos, resolvemos dormir numa praia. Fizemos uma boa fogueira e esperamos o dia clarear. Logo que amanheceu, saímos novamente, e em menos de uma hora encontramos e usufruímos das comodidades do Souza Junior. Apesar do incidente, da fome e da sede, foi uma noite maravilhosa, com milhares de estrelas a nos fazer companhia, na imensidão do lago Erepecuru.
                                                 2º DIA – 24/10/1987
Após a noite perdida, que nos valeu até um apelido dado pelos companheiros (“perdidos na noite”), as máquinas do Souza Junior voltaram a funcionar, rumo ao tabuleiro do Trombetas, 4 horas rio acima. Eram mais ou menos 8 horas da manhã. Neste ponto, o Trombetas começa a ficar mais estreito. Começam a aparecer as primeiras ilhas. Finalmente conseguimos avistar o tabuleiro onde as tartarugas desovam. São bancos de areia, alguns com grande extensão, onde elas, mais tracajás e pitiús (outras espécies de tartarugas) fazem seus ninhos. Por volta do meio-dia, chegamos a um posto do IBDF para a vistoria da embarcação. Foi-nos autorizada a entrada, já que estávamos ali apenas para pescar e fotografar. 



Os tabuleiros onde ocorre a desova das tartarugas.  

Com a autorização (verbal), deslocamos o motor para a entrada de um lago, logo acima do posto. Paramos as máquinas e não tardou 10 minutos para que aparecesse um fiscal desse órgão – diga-se de passagem mal humorado e mal educado – para dizer que não podíamos ancorar naquele local.  O Imbiriba, como chefe da expedição, tentou argumentar que éramos turistas e que mal nenhum iríamos fazer à fauna e flora local. Nosso desejo era apenas pescar. O tal fiscal, diante de nossos argumentos, simplesmente virou as costas, indo embora para seu posto. Pensamos que finalmente poderíamos pescar em paz. Ledo engano: esse fiscal retornou, agora acompanhado de dois policiais federais armados, inclusive com metralhadoras. E começou a discussão. Mais de meia hora de diálogo, ostensivo por parte dos policiais federais, até que um cidadão que parecia ser o chefe cujo nome era Cantarelli, disse-nos que poderíamos ficar em outro local, rio acima, mas que de maneira nenhuma descer nas praias, fotografar ou filmar no local. E mais: que tal reserva fora criada por um “decreto lei”, e a lei “tinha que ser cumprida”. Pois bem, ficou sem resposta a seguinte pergunta: de que adianta fazer uma reserva ecológica, já que ninguém pode ter acesso a ela?



Balsa de madeira encalhada no “santuário ecológico”.

Exatamente aí é que nossas autoridades não sabem distinguir a diferença entre preservar (proibir) e conservar (usar sem destruir). Dialogar com determinados indivíduos chega a ser impossível. Ainda mais com uma “autoridade” de camiseta, shorts e sandálias havaianas. Sinceramente o tal Cantarelli se apoia em “sua” arma para poder mostrar quem é que falava e quem obedecia. Lamentável. Mas ali estávamos nós, no tabuleiro do Trombetas, quase no fim das divisas do Brasil. Por certo – já que havíamos chegado – não iria ser um policial como aquele que iria nos tirar a oportunidade de conhecer o local. Antes, chegamos mesmo a elogiar o cuidado de tal fiscalização, que a vistoria todos os barcos na entrada e na saída da reserva. Mas no mesmo dia já veio o descrédito, pois a mais ou menos 2 km do posto do IBDF, havia uma balsa – pasmem – de madeira. E mais: estava encalhada pela baixa profundidade do rio. Mais 5 km acima e mais outra balsa, carregada e encalhada. De tal incidente, conseguimos apurar que essas balsas são transportadoras de madeira cortada na “reserva do Trombetas”, e que é levada para o porto Trombetas, para alimentar os fornos da mineração Rio do Norte.  Ainda mais: quem corta as árvores é a Cia. Andrade Gutierrez (que está com obras na região) e as “cede” para a mineração de bauxita. Tudo isso, lógico, com conhecimento do IBDF.



Na verdade, a equação pode ser descrita da seguinte maneira: desmatar, queimar e transportar árvores, pode. Pescar amadoristicamente, fotografar, filmar e passear nos lagos e praias, não. Essa deve ser a informação dado por Brasília ao chefe Cantarelli.  E tem mais. Com a autorização de podermos nos locomover com os barcos, pudemos constatar as seguintes irregularidades: queimadas diversas, desmatamento, pesca com redes, um local de venda de tartarugas e, tudo isso dentro da reserva ecológica do Trombetas, Achamos graça inclusive de um morador ribeirinho chamado Oswaldo, quando nos disse que, conforme a época do ano (julho a setembro) muitos “gringos” vêm para acampar. Mas vamos adiante. Após o almoço, conseguimos com a ajuda do Oswaldo, “descobrir” um lago, de nome Abuí. Desse lago saíram os maiores tucunarés que conseguimos ferrar. O maior pesou 5,5 kg. A note do 2º dia chegou.
                                                    3º DIA – 25/10/1987
Logo pela manhã, com os barcos de alumínio, subimos o rio. Após uma hora de viagem, chegamos ao fim do rio Trombetas, no que se refere a navegação. Cachoeira Porteira é o nome do local. Uma pequena vila, que abriga uma maravilha natural: suas cachoeiras. 


Cachoeiras: fim do trecho navegável. 



São diversas quedas d’águas pequenas e mais uma centena de corredeiras. Tomamos banho em uma delas, e chega a impressionar a alta temperatura de suas águas. É uma ducha natural incrível. Falamos com alguns pescadores locais e um deles nos deu a noticia de que, na noite anterior, um filhote (espécie de piraíba) havia arrebentado sua linha de bitola 1.20 mm. Segundo ele, é comum pegar-se peixes de 80 quilos. À tarde, voltamos para o motor e novamente fomos em busca dos tucunarés, sendo nesta pescaria fisgado o maior exemplar, como já dito, de 5,5 kg. À noite, após o jantar, foram ligadas as máquinas do Souza Junior e começava nosso regresso para Santarém.

NOTA DA REDAÇÃO: Desnecessário dizer que as informações com endereços, nomes e telefones devem ser atualizadas. Mas de uma matéria publicada em 1987, ressalta aos olhos de um pescador mais atento, alguns detalhes. Citamos por exemplo, o corte de madeira em uma reserva ecológica e ao fim a que se destina; o nome da Construtora que estava fazendo obras na região; a truculência de autoridades de meio ambiente, com o pescador amador, etc. Esta matéria foi publicada também no Jornal da Tarde e um pouco tempo depois, soubemos que toda a equipe de fiscalização lá da reserva do Trombetas, foi chamada de volta a Brasília.
Nessa aventura, estavam em nossa companhia o Edson da Liguepesca e seu chara Edison da Pesca Pinheiros. 







Revista Aruanã Edição nº.4 – 04/1988          

4 comentários:

  1. Toninho, sua matéria foi de 1987, e minha ida até lá foi nos anos 90, não me lembro qual, mas nada mudou. Os ribeirinhos ainda se queixavam da truculência e maus tratos aos quilombolas da região. Abraços. Acho que esse país não tem jeito...

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  2. Marcão: Essa aventura no Trombetas foi uma tentativa de um hotel de Santarém, de promover ou incentivar a pesca amadora na região. Infelizmente, achamos muito pouco peixe em opção que poderiam atrair nossos companheiros de lazer. Nunca mais voltei à região, a não ser por uma passagem rápida, em escala de avião na cidade de Cachoeira Porteira e com destino a Belém. Você deve lembrar que essa cidade era o ultimo lugar até onde podíamos ir e isto em viagem de barco pelo rio. Confesso que não tive contato com os citados quilombolas. No entanto o que vi e registrei, foi o total desrespeito a um meio ambiente como poucos vistos em outros locais. As fotos de balsas carregadas de madeira de lei, destinadas aos fornos de indústria de bauxita, ribeirinhos vendendo uma infinidade de espécies de tartarugas aos “viajantes” que por lá passavam e, tudo isto praticamente em frente aos postos de fiscalização, na época IBDF e Polícia Federal, mostravam o esquecimento/falta de interesse, de nossas autoridades, pela região. Dizer o que mais meu amigo? Obrigado pela participação, sempre atenta. Fraterno abraço.

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  3. Nossos guias eram quilombolas, e cheguei a ir na comunidade deles. Infelizmente, a pedidos deles, não gravei, apenas uma entrevista fora da comunidade. Fomos também a convite (Troféu) de uma agencia em Santarém sediada no hotel tropical. O dono da agencia era um Frances, de nome Jran Pierre, e sua esposa Perpétua...

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  4. Foi uma tentativa que não deu muito certo, principalmente por causa da pouca piscosidade da região. Lugar muito bonito de fato.

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