|
Neste roteiro, nossa equipe contou com a participação do José
Carlos Padilha e do Noubar Gazarian, companheiros de São Paulo e do Mauro
Santana de São José do Rio Claro, em Mato Grosso. A rota até as matrinchãs,
saindo de São Paulo, passa por Campo Grande e Cuiabá. Partindo desta ultima
cidade, percorremos 330 km para chegar a São José do Rio Claro, nosso destino.
A partir de Cuiabá, pega-se a estrada para Santarém, em um local denominado
Trevo do Lagarto. Após o trevo, a direção é para Sinop/Santarém, percorrendo um
trecho de 160 km. No “Posto do Gil”, deve-se pegar a estrada para Diamantino e
finalmente, por essa mesma estrada, atinge-se São José do Rio Claro. No total,
desde São Paulo, percorremos 1950 km. De toda essa distância, apenas os últimos
110 km, ou seja, de Diamantino até a ponte sobre o Rio Claro (marque bem este
rio), o percurso é feito em estrada de terra.
|
|
A cidade de São José do Rio Claro tem toda a infra-estrutura
necessária ao pescador, incluindo hotéis, supermercados, farmácia, telefone
DDD, etc. No entanto, para se fazer uma pescaria nesse local, será necessário
levar-se barco e motor. Junto à ponte do rio Claro há um local onde se consegue
colocar os barcos na água facilmente, sendo esse acesso permitido para carros e
carretas de barcos. Eram 7:30h de segunda-feira quando colocamos os barcos nas
águas do Rio Claro. Esse rio mostra um espetáculo muito bonito, já que é
totalmente ladeado pela floresta amazônica e em toda a sua extensão as águas
são rápidas e com diversas corredeiras.
A água é muito limpa e além as corredeiras, existem várias
pedras e galhadas, que são os locais preferidos pelas matrinchãs. É onde
devemos jogar nossas iscas. Começamos a descida usando só remos, tarefa
executada com precisão pelo Mauro. Vimos diversas matrinchãs vindo atrás de
nossas iscas artificiais, mas sem fisgar. Da ponte da estrada, após estender-se
por 30 km aproximadamente, o rio Claro termina no rio Arinos. A paisagem é a
mesma, só que com a água mais lenta e também mais turva, o que ocorre até
meados de julho, pois a partir de agosto as águas do Arinos ficam também muito
limpas. Continuamos a bater nossas iscas descendo o rio até o anoitecer, e
percebemos que as matrinchãs não estavam no Arinos, mas sim no rio Claro.
|
|
Resolvemos acampar às margens do Arinos para passar a noite.
Não utilizamos as barracas, mas somente redes de dormir, já que nessa região
não se encontra nenhum inseto que venha a perturbar o pescador amador, seja
durante o dia ou mesmo à noite. O primeiro fato pitoresco desta aventura iria
acontecer nesse acampamento, já que o Noubar nunca havia acampado dessa forma.
A primeira pergunta dele foi sobre a “possível” visita de alguma onça ao
acampamento e como não poderia deixar de ser, várias estórias sobre onças foram
contadas. Sugerimos acender uma fogueira, e quem catou mais lenha foi o Noubar.
Pelo tamanho, parecia uma fogueira de festa junina, e até a hora de dormir, as
chamas foram constantemente alimentadas de lenha pelo Noubar.
Propositalmente armamos sua rede bem perto do mato. Ou seja,
qualquer “coisa” que viesse do mato para o rio, encontraria fatalmente a rede
do Noubar em primeiro lugar. Aqui um pararênteses: na noite anterior havíamos
percebido que o Noubar era um “roncador” dos bons. Por volta das 21:00h, já
estávamos todos nas redes. À noite faz frio, o que nos obriga a usar
cobertores. Estranhamente não ouvimos uma só vez o Noubar roncar. A hora certa
de acordar no acampamento é por volta das 6:00h, pois é o horário em que o sol
começa a nascer. Mas, desde as 4:00h, nosso amigo já estava acordado. Fez café,
e quando acordamos ele já estava dentro do barco, pronto para pescar.
|
|
Tomando café, ele contou que durante a noite havia percebido
“passos silenciosos” rondando sua rede e chegou a jurar que era um “bicho”,
tendo o tal inclusive “bufado” bem embaixo da rede. Segundo o Noubar, o tal
bicho rodeou sua rede e chegou bem perto. Só que ninguém no acampamento ouviu
nada. Essa estória rendeu comentários o dia todo. Após o café descemos batendo
o Arinos por cerca de 10 km e nada de peixe. Almoçamos e resolvemos voltar ao
rio Claro. Subimos novamente o Claro, cerca de 20 km, e descemos batendo nossas
iscas. No final da tarde, só havíamos fisgado algumas matrinchãs, tucunarés e
um pacu, que aqui chamam de “borracha”, o qual tem cor diferente dos pacus do
Pantanal, apresentando inclusive, manchas vermelhas pelo corpo.
|
|
Nesta noite, para a alegria do Noubar, fomos dormir na
fazenda. Na volta do rio, já noite, topamos com uma enorme anta dentro da água.
O lugar era de barranco alto, o que dificultava a subida do animal, e por
diversos minutos, com o auxilio das lanternas ficamos a admirá-lo. Se
quiséssemos poderíamos até tocar a anta com as mãos, tal era sua fragilidade,
pelas condições em que estava. Satisfeita a nossa curiosidade, fomos embora
para a fazenda, deixando-a em paz.
Na quarta feita bem cedo voltamos ao rio Claro. Subimos cerca
de 50km de rio, passando por baixo da estrada de rodagem. A cada nova paisagem,
o rio nos impressionava, pois suas corredeiras são lindas, com água muito
limpa, onde as pedras do fundo são visíveis. Agora já encontramos várias praias
de areia, além de várias galhadas nas margens. Motor desligado e levantado, o
Mauro controla o barco no remo e lá vamos nós ao sabor da correnteza batendo
nossas iscas. No final, várias matrinchãs, sendo algumas grandes, estão no
barco. Bicudas, que da mesma forma são peixes bons de briga, também foram
fisgadas. Nessa etapa da pescaria conversamos com alguns pescadores locais e
ficamos sabendo das principais espécies que podem ser fisgadas no rio Claro e
no rio Arinos. Destacamos: jaú, piraíba (enormes), cachara, bicuda, matrinchã
(a mais procurada), tucunaré, piau, pacu, corvinas (grandes) e trairão.
|
|
A matrinchã, sem dúvida, além de ser a mais esportiva, é o
peixe mais atrativo. Nesta região, sua pesca tem característica especial, e é
fisgada principalmente com iscas artificiais, no caso spinners, colheres e
mesmo plugs de meia-água ou de superfície. Os spinners e colheres são os mais
eficientes. No entanto, os lances devem ser dados com precisão, principalmente
junto às margens onde haja corredeiras e galhadas parcialmente submersas. Dá-se
o lance e assim que a isca bate na água, recolhe-se imediatamente, no molinete
ou carretilha com relativa velocidade, já que a água do rio é muito rápida.
No outro dia, fomos a um lugar chamado Lagoão,
no rio Arinos, que é mesmo uma grande lagoa, mais ou menos a uns 20 km da foz
do rio Claro.
|
|
Do rio até a lagoa, são aproximadamente 100 metros no meio da
mata. Por preguiça não levamos nosso barco de alumínio, já que o Mauro disse
que havia um “barco” de madeira que poderíamos usar. Realmente lá estava ele, e
parcialmente submerso. Puxamos o barco para a margem, esgotamos sua água e nele
colocamos um motor elétrico como propulsão. O barco “fazia” muita água, que
“brotava” do fundo, feito uma nascente natural. Enquanto dois pescavam, o
terceiro tirava água. Ficar de pé então, nem pensar, já que com um movimento
mais brusco entrava água pela borda. Mesmo assim, fisgamos vários tucunarés de
bom tamanho. Essa lagoa é bem grande e dá, se estivermos bem equipados, para
explorar muito bem seu tamanho, não só nos tucunarés, mas também nos trairões.
Suas margens são de floresta absoluta e em alguns locais
constatamos rastros de animais como veados, pacas, capivaras, antas e onças. Nas
árvores vimos diversas jacutingas, papagaios e um casal de araras azuis. Devido
à fragilidade do barco, pescamos por apenas duas ou três horas. À tarde
voltamos às matrinchãs no rio Claro e mais uma vez fizemos uma boa pescaria. No
ultimo dia, resolvemos bater mais rio e verificar as condições. Facilmente o
pescador amador que aqui vier pescar, conseguira identificar os pesqueiros da
matrinchã, pelo que já foi dito nesta matéria. Os grandes poções, para quem
gosta de jaús e piraíbas, também são facilmente encontrados, pois normalmente
estão logo após as corredeiras de pedras e nas curvas mais acentuadas do rio,
principalmente do Arinos. Para descobrir um poço, é só olhar o espelho da água,
que passa a ser mais manso e com redemoinhos grandes.
|
|
O melhor nesses locais é pescar apoitado, com equipamento
pesado e usando como isca pedaços de peixes da região, como por exemplo,
traíra, piau e mesmo matrinchã. Normalmente, fisgamos a bicuda em rios de
corredeira e poderíamos dizer que ela tem os mesmos hábitos da matrinchã. Sua
preferencia é ficar perto dos obstáculos do rio, tais como pedras e tranqueiras
das margens. Um bom material para sua pesca é o classificado na categoria
média, usando-se linha entre 0.35 e 040 milímetros. Predador por excelência é
um peixe que ataca qualquer tipo de isca natural, preferindo especialmente
pequenos peixes vivos e inteiros, ou ainda filés de outros peixes. Seu horário
de atuação estende-se por todo dia, e até mesmo durante a noite. Por essa
razão, e tendo em vista podermos bater mais o rio, ao sabor das águas,
recomendamos o uso de iscas artificiais, tais como colheres, spinners, jigs e
plugs, sendo estes últimos de superfície ou meia-água.
|
|
Em razão da violenta briga que a bicuda proporciona, no caso
em que o pescador esteja usando plugs, recomenda-se que estes sejam do tamanho
médio, como Rapala Original e Huski, os Red Fin (de barbela), as zaras e os
poppers ou sticks. É conveniente que se use garatéias reforçadas variando o
tamanho entre o número 2 e o 4. As cores para os plugs podem ser variadas, já
que não há uma cor predominante com melhores resultados ou mais recomendadas.
Já fisgamos bicudas em plugs cromeados azuis e pretos, amarelos, verdes, etc. Com
referência às iscas “de metal”, também não há uma regra básica em termos de
cores, mas no trabalho delas na água, podemos afirmar que as cromeadas cor de
prata são as que mais se parecem com os pequenos peixes apreciados pelas
bicudas.
Para que tenhamos uma pescaria de bicudas mais produtiva no
caso da utilização de iscas artificiais, o mais recomendável é deixarmos o
barco fluir ao sabor da correnteza, controlando-o apenas com os remos, para que
mantenha posição paralela às margens. Os lances com as iscas devem ser dados
junto às pedras, que tanto podem estar no meio do rio como nas margens, e nas
tranqueiras de margem. Evidente está que há determinados locais onde, antes do
lance, praticamente já sabemos que o peixe irá fisgar, e esses lugares são
aqueles onde se formam pequenos remansos, determinados pela força da
correnteza, logo após as pedras ou tranqueiras. Arremessando com precisão
nesses locais, o ataque é quase imediato, pois a bicuda é muito valente e ataca
a isca com determinação.
|
|
Ao pescador só restará então fisgar com moderada força e se
preparar para uma boa briga, e o que é melhor: sem pressa de retirar o peixe da
água, já que se trata de espécie que pouco se presta para o consumo, devido ao
sabor comum de sua carne, a qual, além disso, é bastante entremeada de
espinhas. O mais importante a se frisar na pesca da bicuda é a esportividade,
pois com a fricção do equipamento (molinete ou carretilha) regulada para a
metade da capacidade de resistência da linha, ficaremos brigando com o peixe
por um bom tempo, e a bicuda só irá se entregar quando extenuada. Use um puçá
para retirá-la da água (lembre-se de que ela será solta) e segure-a firmemente
por trás da cabeça, a fim de que possa retirar o anzol com segurança.
A melhor época para a pesca da bicuda, sem dúvida, vai de
agosto a outubro. Se levarmos em consideração que se trata de um peixe bastante
especial, principalmente naquilo que mais nos interessa que é a briga
proporcionada, teremos que classificar a bicuda como mais uma campeã na
preferência dos pescadores amadores, pois mesmo não se prestando para o
consumo, trata de todas aquelas emoções que somente um verdadeiro pescador
amador sabe compreender e aproveitar.
|
|
Alguns pontos em especial nos chamaram a atenção neste roteiro.
Por exemplo: não se vê a pesca profissional feita com redes ou tarrafas. Os
profissionais de lá usam somente linha e anzol. O peixe mais visado é a
matrinchã, e o mais incrível é que, além da isca natural (que é de caju e
outras frutas), pescam com spinners. Aliás, fabricam o próprio spinners, meio
rústico, mas bastante resistente. Há inclusive em São José do Rio Claro uma
loja que os vende. Lá, são chamados de “espina”. Um outro ponto bastante
curioso é a total ausência de piranhas. Não fisgamos nenhuma, e em conversa com
o pessoal local, também eles desconhecem a presença desse predador.
Com raríssimas exceções seremos incomodados por qualquer tipo
de inseto, como pernilongos, borrachudos ou pólvoras. Porém há muitas abelhas e
com isso devemos tomar alguns cuidados especiais. Caso o pescador vá parar na
margem, é bom verificar se não há algum enxame em trânsito. Para sua proteção,
o melhor é levar sacos plásticos grandes e transparentes e em caso de ataque de
abelhas, vestí-los rapidamente e ficar imóvel, dentro do barco ou dentro da
água.
Finalmente, devemos levar equipamento total de barco e motor.
Caso o pescador queira acampar, em toda a extensão do rio acham-se clareiras na
mata com condições para tanto. Lembre-se de que apesar do calor durante o dia, à
noite a temperatura cai bastante, chegando a 14 graus ou menos. Em São José do
Rio Claro há hotéis com todo o conforto, além de restaurantes. A distância que
separa a cidade do rio é de apenas 18 km em asfalto e com fácil acesso junto à
ponte, para a descida dos barcos. Essa é uma boa opção e lógico, mais cômoda.
Apesar da distância, a equipe Aruanã recomenda esse roteiro,
pois a pesca é farta e esportiva, a região é muito bonita e os rios de uma
beleza incrível. Falar da esportividade da matrinchã será desnecessário e sobre
isso podemos dizer que se trata de um dos peixes mais nobres esportivos da
Bacia Amazônica.
|
AGRADECIMENTOS
Queremos agradecer ao José Carlos Padilha, profundo
conhecedor da região e da pesca da matrinchã.
Agradecemos também ao Noubar Gazarian, pelo companheirismo e dedicação à
nossa equipe. Por certo, sem a ajuda destes dois amigos, seria muito mais
difícil realizar esse roteiro.
Fui feliz ao poder ler essa reportagem na época da publicação e depois de adulto conhecer o rio claro e fisgar matrinxãs em iscas artificiais... parabéns pela iniciativa de publicar as antigas reportagens...
ResponderExcluirWlembi: A sua frase, "depois de adulto" é muito significativa para nós da Aruanã. Esse pensamento seu, vai de encontro a nossa ideia para voltarmos a publicar a Aruanã, agora no formato de blog, já que na época que paramos - 2001/2002 -, muito jovens na época não a tinham visto em bancas. Quanto ao rio Claro, sem comentários. Foi um dos mais belos rios que visitamos. Abraço
ResponderExcluirViajei no tempo, Toninho, conheci e pesquei várias vezes nesses rios, ótimas lembranças...
ResponderExcluirPois é Marcão: Isso ninguém nos tira. Tivemos o prazer e a felicidade de navegarmos e pescar em rios praticamente virgens. O meio ambiente era total, em todos os sentidos. Graças a Deus meu amigo. Obrigado. Fraterno abraço
ResponderExcluir