O pescador amador às vezes, por puro comodismo, prefere comprar para sua pescaria de costão o camarão morto ou a sardinha. Afinal de contas, pega-se a quantidade que se quer, sem trabalho algum, além de ser muito fácil de conseguir. Mas serão estas iscas as melhores para o costão? Descubra a realidade.
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Saquaritá semi aberto
Quando se vai a uma pescaria, a nossa tralha só estará
completa com o ultimo e importante item: a isca natural. Na hora de montar o
equipamento, começamos pela vara de pesca, molinete ou carretilha, passando
pelos passadores, ponteira da vara, montagem do chicote ou arranque, anzóis e
chumbo. E só aí entra a isca natural. Na
hora do peixe fisgar, a inversão é total. Primeiro ele engole a isca, depois o
anzol que o fisga, a linha que o segura e trabalha, o molinete ou a carretilha
que irá recolher e a vara de pesca para trabalhar e cansar o peixe, até que
finalmente ele chegue às nossas mãos, atestando nossa perícia como pescadores
amadores. Na primeira parte, tudo depende do pescador amador, porém na segunda
parte, dependemos exclusivamente da vontade do peixe. Afinal, se ele não morder
a isca, com certeza o pescador irá ficar o dia todo (usando uma expressão bem
comum...) “no dedo”. E não há nada mais frustrante do que ficar “no dedo” e
voltar para casa com samburá vazio. Por certo, à volta para casa será menos
alegre e a simples imagem do samburá vazio, entristecedora. Pior que isso é
encontrar outro pescador que pescou no costão e com sucesso, enchendo o seu
samburá de peixes. Sorte? Melhor pesqueiro?
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Corrupto
Com certeza a resposta para essas duas perguntas é não. E,
por mais duro que isso possa parecer, temos que reconhecer que esse pescador
pesca melhor do que nós. A prova ali está e é incontestável, ao mesmo tempo que
desoladora. Qual será o segredo desse pescador, que usando o mesmo material e
pescando na mesma modalidade, conseguiu tanto sucesso? A resposta é simples e
segura: a isca. E com certeza não foi a mesma isca usada pelo pescador que
ficou “no dedo”. Vamos voltar no tempo e acompanhar o pescador de sucesso. A
história seria mais ou menos assim: Uma semana antes, ele havia escolhido a
melhor maré para a pesca no costão. Por sua experiência, ele sabia que as marés
altas ou de lua, são as melhores. Olhando a tábua de marés, concluiu que o
melhor horário era na enchente da maré, que se daria por volta de 11 horas da
manhã. Pois bem, nosso herói resolveu sair bem cedo de casa para aproveitar
quando a maré estivesse bem baixa. Passou em frente ao vendedor de camarão e
sardinha e não parou, foi direto para seu costão preferido. Chegando lá, antes
de se preocupar com a montagem do equipamento, sua preocupação maior foi conseguir
o maior número de iscas variadas para sua pescaria. Afinal de contas, quem
pesca na pedra tem que ter isca de pedra.
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Quebrando mariscos
Munido de um balde, começou a pegar alguns caranguejos “santolas”,
que costumam ficar em baixo das pedras menores. Montou um pequeno caniço e com
algumas baratinhas pegas na hora, fisgou alguns amborés que estavam na água,
entre as frestas da pedra. Nas frestas maiores, perto da água, munido de uma
varinha com um laço de arame de aço na ponta e oferecendo como isca um amboré,
conseguiu pegar alguns caranguejos guaiás enormes. Em uma busca rápida pelas
pedras, pegou alguns caramujos saquaritás e um ou outro ermitão que se alojava
nas cracas. Mais perto da água, com o auxilio de uma espátula, arrancou uma boa
quantidade de mariscos para isca e para a ceva. Mesmo sendo a baratinhas do mar
um “bichinho” arisco, nosso herói sabe que a melhor maneira de pegar essa
excelente isca é com um saco plástico grande e de boca aberta para cima (elas
não conseguem subir pelas paredes do saco), ir pegando as pedras menores e as
sacudindo dentro do saco. Vez por outra caem duas ou três baratinhas do mar de
bom tamanho. Não usou um pano molhado e uma isca pequena, e quando elas em
bando se juntam para comer, joga o pano molhado em cima delas e as pega com
mais facilidade.
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Pedra com mariscos
Tem ainda um jeito de como pegá-las com as mãos, “nas curvas”
das pedras, mas isso fica para se abordar em uma outra hora. Em uma rememorada
rápida, ele já sabe que tem as seguintes iscas a sua disposição: santolas, amborés,
guaiás, saquaritás, ermitão, mariscos e baratinhas. Gastou nessa tarefa mais ou
menos duas horas, o tempo exato para a mudança da maré, que começou a subir,
sendo, portanto a melhor hora para aquele tipo de pescaria. Montou sua vara de
pesca que, lógico, tinha mais de três metros e meio de comprimento, linha 0.40
milímetros, amarrou o “engate rápido”, colocou o anzol certo é o chumbo tipo
gota (mais difícil de enroscar) e escolheu a isca para começar a pescar. Com os
mariscos que havia pegado em boa quantidade, amassou com uma pequena pedra, um
monte deles e os jogou no mar, a título de ceva. Qualquer isca era uma boa isca, desde que se
pescasse não muito longe da pedra. Aliás, naquele lugar ele sabia que existia
um poço, já que a formação da espuma das ondas lhe dava essa indicação. Afinal
de contas, ele tinha aprendido que a espuma da água mais perto da pedra significava
local mais fundo e melhor para a pesca de costão.
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Guaiá
Em dois anzóis, colocou uma isca diferente da outra e começou
a pescar. Durante o dia, faria novas experiências com outras iscas. E assim
pescou mais ou menos durante 6 horas, até o reponto da maré de alta para baixa.
A pedra escolhida para pescar lhe dava toda a segurança de poder ficar em pé e
caminhar. Era mais alta do que a maré mais ou menos dois metros e isso não era
problema, já que em sua tralha havia um bicheiro, que por “coincidência” tinha
um cabo com comprimento de dois metros e meio. Na hora de vir embora recolheu o
equipamento, guardou, e as iscas que sobraram e que havia conservado vivas (já que
isca viva é muito mais natural) foram devolvidas a seus ambientes. O saquaritá
grudou-se de novo na pedra, o guaiá, o amboré, os mariscos, santolas e as baratinhas
foram para seus locais originais e isso – raciocinou ele – era bom, pois na
próxima pescaria era só procura-los novamente. Mais para trás, na pedra, uma
fieira, feita com cordinha de nylon (que antes estava na água), apresentava
peixes como caratingas, garopas, badejos, pampos, sargos-de-beiço e
sargos-de-dente, uma miraguaia pequena e como prêmio maior, fisgados no amboré,
dois robalos de bom tamanho. Arrumou a tralha toda, enfiou os peixes no samburá
e com cuidado saiu do costão.
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Pescando a própria isca
Ao chegar ao carro, encontrou dois pescadores que haviam
estacionado por perto e que estavam desde cedo pescando. Com exceção de um ou
outro peixe pequeno, tinham ficado “no dedo” o dia todo. Quando viram os peixes
do nosso herói se admiraram, e perguntaram onde tinha sido aquela ótima
pescaria. Informados que fora no mesmo costão, admiraram-se, mas não falaram
nada, já que em suas mentes a frase era a seguinte: “Ô sujeito que tem uma
sorte desgraçada!” Pois é, esses pescadores tinham usado como isca camarão e
sardinha, comprados facilmente. Não que essas duas iscas não sejam boas, mas em
se tratando de pesca de costão as iscas usadas por nosso herói eram muito
melhores, já que eram muito mais naturais e que os peixes do costão estavam
acostumados a encontra-las nas pedras. E tem mais: se fosse em outro costão,
mais perto da praia, nosso herói teria como preocupação, além das iscas usadas,
de levar também alguns corruptos, tatuíras e sarnambis, que seriam pegos na
praia com a maré baixa. Para finalizar, só a seguinte pergunta: sorte ou
conhecimento? E, voltando para casa, quais dos dois pescadores estaria mais
feliz? Cansado é fácil de saber, já que procurar isca de pedra dá muito mais
trabalho. Mas também dá muito mais peixe.
NR: Na ocasião da publicação dessa matéria na Revista Aruanã,
recebemos dezenas de ligações informando alguns, que suas pescarias, com as
dicas dadas, haviam melhorado 1.000 por cento o resultado delas. Queremos ainda
afirmar que com iscas artificiais – em se estando no costão – fica mais difícil
a pesca, porque o pescador tem dificuldades de locomoção e até perigo de graves
acidentes nessa locomoção. Ficar pescando com isca artificial no mesmo local, dando
lances sucessivos, não é lá “muito interessante”.
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Revista Aruanã Ed: 25 Publicada em 12/1991
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