sábado, 17 de agosto de 2019

DICA - ISCA DE PEDRA










O pescador amador às vezes, por puro comodismo, prefere comprar para sua pescaria de costão o camarão morto ou a sardinha. Afinal de contas, pega-se a quantidade que se quer, sem trabalho algum, além de ser muito fácil de conseguir. Mas serão estas iscas as melhores para o costão? Descubra a realidade.


Saquaritá semi aberto 
Quando se vai a uma pescaria, a nossa tralha só estará completa com o ultimo e importante item: a isca natural. Na hora de montar o equipamento, começamos pela vara de pesca, molinete ou carretilha, passando pelos passadores, ponteira da vara, montagem do chicote ou arranque, anzóis e chumbo. E só aí entra a isca natural.  Na hora do peixe fisgar, a inversão é total. Primeiro ele engole a isca, depois o anzol que o fisga, a linha que o segura e trabalha, o molinete ou a carretilha que irá recolher e a vara de pesca para trabalhar e cansar o peixe, até que finalmente ele chegue às nossas mãos, atestando nossa perícia como pescadores amadores. Na primeira parte, tudo depende do pescador amador, porém na segunda parte, dependemos exclusivamente da vontade do peixe. Afinal, se ele não morder a isca, com certeza o pescador irá ficar o dia todo (usando uma expressão bem comum...) “no dedo”. E não há nada mais frustrante do que ficar “no dedo” e voltar para casa com samburá vazio. Por certo, à volta para casa será menos alegre e a simples imagem do samburá vazio, entristecedora. Pior que isso é encontrar outro pescador que pescou no costão e com sucesso, enchendo o seu samburá de peixes. Sorte? Melhor pesqueiro? 

Corrupto
Com certeza a resposta para essas duas perguntas é não. E, por mais duro que isso possa parecer, temos que reconhecer que esse pescador pesca melhor do que nós. A prova ali está e é incontestável, ao mesmo tempo que desoladora. Qual será o segredo desse pescador, que usando o mesmo material e pescando na mesma modalidade, conseguiu tanto sucesso? A resposta é simples e segura: a isca. E com certeza não foi a mesma isca usada pelo pescador que ficou “no dedo”. Vamos voltar no tempo e acompanhar o pescador de sucesso. A história seria mais ou menos assim: Uma semana antes, ele havia escolhido a melhor maré para a pesca no costão. Por sua experiência, ele sabia que as marés altas ou de lua, são as melhores. Olhando a tábua de marés, concluiu que o melhor horário era na enchente da maré, que se daria por volta de 11 horas da manhã. Pois bem, nosso herói resolveu sair bem cedo de casa para aproveitar quando a maré estivesse bem baixa. Passou em frente ao vendedor de camarão e sardinha e não parou, foi direto para seu costão preferido. Chegando lá, antes de se preocupar com a montagem do equipamento, sua preocupação maior foi conseguir o maior número de iscas variadas para sua pescaria. Afinal de contas, quem pesca na pedra tem que ter isca de pedra. 

Quebrando mariscos
Munido de um balde, começou a pegar alguns caranguejos “santolas”, que costumam ficar em baixo das pedras menores. Montou um pequeno caniço e com algumas baratinhas pegas na hora, fisgou alguns amborés que estavam na água, entre as frestas da pedra. Nas frestas maiores, perto da água, munido de uma varinha com um laço de arame de aço na ponta e oferecendo como isca um amboré, conseguiu pegar alguns caranguejos guaiás enormes. Em uma busca rápida pelas pedras, pegou alguns caramujos saquaritás e um ou outro ermitão que se alojava nas cracas. Mais perto da água, com o auxilio de uma espátula, arrancou uma boa quantidade de mariscos para isca e para a ceva. Mesmo sendo a baratinhas do mar um “bichinho” arisco, nosso herói sabe que a melhor maneira de pegar essa excelente isca é com um saco plástico grande e de boca aberta para cima (elas não conseguem subir pelas paredes do saco), ir pegando as pedras menores e as sacudindo dentro do saco. Vez por outra caem duas ou três baratinhas do mar de bom tamanho. Não usou um pano molhado e uma isca pequena, e quando elas em bando se juntam para comer, joga o pano molhado em cima delas e as pega com mais facilidade. 

Pedra com mariscos
Tem ainda um jeito de como pegá-las com as mãos, “nas curvas” das pedras, mas isso fica para se abordar em uma outra hora. Em uma rememorada rápida, ele já sabe que tem as seguintes iscas a sua disposição: santolas, amborés, guaiás, saquaritás, ermitão, mariscos e baratinhas. Gastou nessa tarefa mais ou menos duas horas, o tempo exato para a mudança da maré, que começou a subir, sendo, portanto a melhor hora para aquele tipo de pescaria. Montou sua vara de pesca que, lógico, tinha mais de três metros e meio de comprimento, linha 0.40 milímetros, amarrou o “engate rápido”, colocou o anzol certo é o chumbo tipo gota (mais difícil de enroscar) e escolheu a isca para começar a pescar. Com os mariscos que havia pegado em boa quantidade, amassou com uma pequena pedra, um monte deles e os jogou no mar, a título de ceva.  Qualquer isca era uma boa isca, desde que se pescasse não muito longe da pedra. Aliás, naquele lugar ele sabia que existia um poço, já que a formação da espuma das ondas lhe dava essa indicação. Afinal de contas, ele tinha aprendido que a espuma da água mais perto da pedra significava local mais fundo e melhor para a pesca de costão. 

Guaiá
Em dois anzóis, colocou uma isca diferente da outra e começou a pescar. Durante o dia, faria novas experiências com outras iscas. E assim pescou mais ou menos durante 6 horas, até o reponto da maré de alta para baixa. A pedra escolhida para pescar lhe dava toda a segurança de poder ficar em pé e caminhar. Era mais alta do que a maré mais ou menos dois metros e isso não era problema, já que em sua tralha havia um bicheiro, que por “coincidência” tinha um cabo com comprimento de dois metros e meio. Na hora de vir embora recolheu o equipamento, guardou, e as iscas que sobraram e que havia conservado vivas (já que isca viva é muito mais natural) foram devolvidas a seus ambientes. O saquaritá grudou-se de novo na pedra, o guaiá, o amboré, os mariscos, santolas e as baratinhas foram para seus locais originais e isso – raciocinou ele – era bom, pois na próxima pescaria era só procura-los novamente. Mais para trás, na pedra, uma fieira, feita com cordinha de nylon (que antes estava na água), apresentava peixes como caratingas, garopas, badejos, pampos, sargos-de-beiço e sargos-de-dente, uma miraguaia pequena e como prêmio maior, fisgados no amboré, dois robalos de bom tamanho. Arrumou a tralha toda, enfiou os peixes no samburá e com cuidado saiu do costão. 

Pescando a própria isca
Ao chegar ao carro, encontrou dois pescadores que haviam estacionado por perto e que estavam desde cedo pescando. Com exceção de um ou outro peixe pequeno, tinham ficado “no dedo” o dia todo. Quando viram os peixes do nosso herói se admiraram, e perguntaram onde tinha sido aquela ótima pescaria. Informados que fora no mesmo costão, admiraram-se, mas não falaram nada, já que em suas mentes a frase era a seguinte: “Ô sujeito que tem uma sorte desgraçada!” Pois é, esses pescadores tinham usado como isca camarão e sardinha, comprados facilmente. Não que essas duas iscas não sejam boas, mas em se tratando de pesca de costão as iscas usadas por nosso herói eram muito melhores, já que eram muito mais naturais e que os peixes do costão estavam acostumados a encontra-las nas pedras. E tem mais: se fosse em outro costão, mais perto da praia, nosso herói teria como preocupação, além das iscas usadas, de levar também alguns corruptos, tatuíras e sarnambis, que seriam pegos na praia com a maré baixa. Para finalizar, só a seguinte pergunta: sorte ou conhecimento? E, voltando para casa, quais dos dois pescadores estaria mais feliz? Cansado é fácil de saber, já que procurar isca de pedra dá muito mais trabalho. Mas também dá muito mais peixe.


NR: Na ocasião da publicação dessa matéria na Revista Aruanã, recebemos dezenas de ligações informando alguns, que suas pescarias, com as dicas dadas, haviam melhorado 1.000 por cento o resultado delas. Queremos ainda afirmar que com iscas artificiais – em se estando no costão – fica mais difícil a pesca, porque o pescador tem dificuldades de locomoção e até perigo de graves acidentes nessa locomoção. Ficar pescando com isca artificial no mesmo local, dando lances sucessivos, não é lá “muito interessante”.




Revista Aruanã Ed: 25 Publicada em 12/1991





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