sexta-feira, 10 de novembro de 2017

ESPECIAL - TAMANHO É DOCUMENTO








Em se tratando de peixes, mais do que nunca, tamanho é documento. Vamos tratar desse assunto e também do pesca e solte, já que muita gente anda fazendo e falando bobagem a respeito.





Black Bass com 25 cm

Às vezes, presenciamos pescadores amadores fazendo bobagens em suas pescarias e até mesmo cometendo crimes com os quais não podemos concordar. Alguns exemplos? Vamos lá. Começamos pelo black bass que, como todos sabem, é um peixe importado que se aclimatou muito bem no Brasil, principalmente no sul de Minas Gerais, São Paulo e em todos os estados da região sul do país. É um peixe bastante esportivo, especialmente para quem pesca com iscas artificiais. O “problema” desse peixe, quando filhote, é que fica junto às margens de nossas represas e se alimenta basicamente de organismos, como pequenos peixes e... minhocas. É aqui que a coisa “pega”. É muito comum aquele pescador de beira de represa que usa minhoca, pegar vários peixes dessa espécie que não chegam a medir 10 centímetros de comprimento. Certa ocasião, na Cachoeira do França (SP), vi um pescador desse tipo com uma fieira onde haviam mais de trinta pequenos exemplares de black bass. Informei-o de que espécie se tratava, e disse-lhe que o black bass atingia mais de 1 quilo facilmente. Não foi surpresa ouvi-lo responder que não conhecia tal peixe. Pura falta de informação, mas com certeza ele agora sabe se deverá soltar ou não esses pequenos peixes em suas futuras pescarias. Um outro exemplo revoltante são alguns pescadores de robalos que se gabam de fisgar numa só pescaria 200 ou 300 peixes dessa espécie, principalmente na região de Cananéia (SP). 

Canoas de pescadores profissionais em Cananéia

A despeito da quantidade contada às centenas, toda essa “pescaria” cabe com folga dentro de um isopor de 60 litros. São robalos pebas e flechas, que não atingem 10 cm de comprimento. Pergunto: um pescador que procede dessa maneira é só desinformado ou é mau caráter mesmo? Neste caso em particular, a segunda hipótese parece se encaixar melhor, já que além de tratar-se de uma espécie conhecida, existe uma Portaria específica a respeito amplamente divulgada, limitando em 30 cm para o peba e 45 cm para o flecha. (NR: na ocasião da publicação. Essas medidas foram alteradas) No entanto, não são poucos os pescadores que cruelmente continuam a praticar verdadeiros extermínios de robalos pequenos. Outro peixe vítima de matança indiscriminada é o tucunaré, e infelizmente não há Portaria estabelecendo tamanhos mínimos para a captura dessa espécie. O ideal seria embarcar peixes com mais de 35 cm de comprimento, pois assim esses teriam a oportunidade de proceder duas ou três desovas. E novamente muito se ouve falar de pescarias de tucunarés onde o “pescador” (ou seria idiota?) se gaba de fisgar mais de 100 minúsculos peixes. Particularmente, recordo-me da represa de Itumbiara em Goiás, onde era (reparem no tempo do verbo) possível realizar grandes pescarias. 

                        Robalo peva

Lamentavelmente, há cerca de três ou quatro anos, essa represa começou a ser muito frequentada por um “bando” de indivíduos provenientes de certo Estado, que se gaba de ter os melhores pescadores do Brasil. Resultado óbvio: os tucunarés de Itumbiara foram praticamente dizimados. Eu mesmo tive a triste oportunidade de assistir o revoltante desempenho de uma dupla de pescadores que, após uma semana pescando nessa represa, mataram e levaram para casa nada menos que 600 tucunarés. Fica a pergunta: estão eles certos quando se consideram pescadores e chamam essa carnificina de “pescaria”? Atualmente, não é fácil fazer uma boa pescaria em Itumbiara, e por conta disso, não só essa dupla como outros de seu bando deixaram de frequentar a represa. Seguramente estão agora depredando outro local. E há muitos outros exemplos que poderíamos citar, pois os perversos crimes contra os peixes pequenos acontecem em todo o Brasil, embora com menor incidência no Pantanal, já que lá a fiscalização é mais intensa. Um dos objetivos principais da Aruanã, e também minha intenção ao escrever esse artigo, é conscientizar o pescador amador de sua responsabilidade no que se refere à preservação do meio ambiente e das espécies, principalmente naquilo que diz respeito aos peixes pequenos, pois o único caminho certo é solta-los.

O pequeno tucunaré convida o pescador a solta-lo 

E não me venham com a desculpa de que não adianta nada soltar, já que ninguém faz isso, pois tal hipótese (que até pode ser verdadeira) não justifica de modo algum a atitude pessoal de cada um de nós. Se você não costuma soltar o peixe pequeno, lembre-se de que, no mínimo, você está se igualando em comportamento àqueles ridículos “pescadores” que você tanto condena. Um outro problema é a falta de informação a respeito do sistema pesque e solta. No Brasil, de uns tempos para cá, essa prática tornou-se corriqueira em vídeos de pesca e programas de televisão (ao vivo é mais difícil presenciar), nos quais os protagonistas, após fisgarem os peixes, fazem questão de solta-los alardeando a própria atitude, nobre, sem dúvida. Até aqui tudo bem, considerando que também nós, nos vídeos produzidos pela Aruanã, praticamos o pesque e solta, que é uma tendência mundial. No nosso caso explicamos que o registro das imagens dos peixes filmados é o suficiente, pois esse é o fim almejado durante a produção do vídeo. Mas o pescador amador deve seguir os exemplos televisivos e praticar o pesque e solta indistintamente? A resposta é não. Calma. Não quero ser mal interpretado, e vou esclarecer o porque dessa resposta. Se o pescador amador pegou um peixe de maneira esportiva, ou seja, com anzol, ninguém tem mais direito do que ele de levar esse peixe para si e sua família, pois é um peixe completamente saudável e, portanto, um alimento puro. 

Dourado abaixo da medida permitida é solto pelo pescador

Por outro lado, a consciência de cada um é que vai determinar que quantidade de peixes deve levar para casa. Se me permitem uma sugestão, creio que devemos levar para casa somente a quantidade ideal para consumo de nossa família, o que obviamente exclui aqueles peixes excedentes que levamos... para dar aos amigos. E isso por duas razões: a primeira é que seu amigo jamais irá dar o devido valor a esse peixe, e a segunda é que você não precisa distribuir peixes para provar que é um bom pescador. Infelizmente, ainda há aquele tipo de individuo que pensa que se o bairro inteiro ficar sabendo que pegou muito peixe, levará a fama de ser um bom pescador. Ser bom ou não, é coisa que não interessa a mais ninguém além de nós mesmos. Vamos abordar outro aspecto. A capa de uma certa edição da Aruanã trazia a foto de um pescador segurando seis ou sete robalos, todos claramente na medida. Naquela ocasião, recebi um telefonema de um desses famosos “professores” recém-especializados em pesca esportiva criticando essa foto, pela “quantidade” de peixes mostrada. Como quem fala o que quer está arriscando a escutar o que não quer, principalmente quando fala sem estar fundamentado na realidade, esse “expert” acabou ouvindo poucas e boas. Disse a ele que ao invés de tentar conquistar notoriedade criticando a Aruanã, ele seria muito mais útil se tivesse a disposição de se por a campo por exemplo nas feiras-livres, peixarias e supermercados, denunciando e combatendo toda aquela barbaridade de peixes fora de medida e expostos ao público. 

                        O pesque e solta consciente, tenta evitar este desastre (black bass)

Perguntei-lhe por que ele não procurava cobrar do Ibama leis de maior proteção a nossos peixes e combate à pesca predatória. Disse que se ele ao menos fizesse isso, com certeza eu aceitaria sua crítica, mesmo achando infundada, já que se assim fosse, a tal critica estaria partindo de alguém que se preocupa realmente com os problemas da pesca esportiva brasileira. Parece lógico que um veículo de informação, pelo simples fato de se direcionar a um grande público (no nosso caso, os pescadores amadores), tem o dever e a obrigação de manter esse mesmo público informado sobre quais são as atitudes mais corretas dentro do meio ambiente. Ninguém contesta que a Aruanã faz isso.  Aliás, só a Aruanã faz um trabalho realmente sério em defesa do meio ambiente, e a essa constatação é muito fácil de se chegar. É só comparar nosso trabalho – onde apontamos vários erros de nossas autoridades de meio ambiente, muitas vezes com duras críticas – ao trabalho de outros veículos de informação que atuam no mesmo segmento. Ao contrário do que muitos afirmam, não se trata de uma questão de coragem, mas antes de tudo, de uma questão de bom senso, pois nosso esporte depende da preservação do meio ambiente e da atitude do pescador amador. Na ausência de qualquer um dos dois itens o resultado é que não sobreviveremos.


                                                            Pesca amadora: direito ao peixe 

Assistindo a um desses programas de pesca na televisão há alguns dias atrás, observei que após pegar um robalo e lutar com ele, caprichando no próprio desempenho artístico, o “protagonista” anunciou que ia soltar esse peixe e começou a encenar esse procedimento. Mas, a soltura propriamente dita não foi ao ar. Era um grande robalo flecha, que, ao que tudo indica, muito provavelmente foi consumido pela equipe de filmagem ao invés de ser devolvido à água. Por certo, a sequência de imagens teria ficado menos ridícula se o pescador assumisse perante a câmera – já que era seu direito – que aquele robalo iria ser aproveitado por sua equipe. Essa teria sido uma atitude muito mais honesta. E menos hipócrita. Concluindo, devemos sempre ter a consciência de que quando o assunto é peixe, tamanho é documento. Nosso dever é soltar todos os peixes pequenos, sem exceção. E quanto aos grandes, o bom senso de cada pescador determinará quantos deverão ser devolvidos à água. É importante que não nos deixemos convencer por conceitos deturpados e filmagens muitas vezes são falsas ou editadas. O certo mesmo é ter sensibilidade suficiente para ouvir a voz da própria consciência e perceber o que é direito em termos de pesque e solta. Digo mais: bom senso, sensibilidade e consciência são características inerentes a pessoas dignas e honestas, que agem dentro desses parâmetros não só na hora de ir pescar, mas em todas as atividades de seu dia a dia. Boas pescarias!

Publicado na Revista Aruanã Ed: nº55 em 02/ 97

2 comentários:

  1. Obrigado mais uma vez Marcão. Nossas ponderações sobre determinados assuntos, na maioria das vezes se dá, devido a nossa bagagem construídas pelas situações vividas e, que nós vivenciamos.

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