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Jararaca
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No Brasil ocorrem atualmente cerca de
20 mil acidentes com serpentes peçonhentas por ano (12/1993).
Em suas incursões à beira d’água o pescador deve estar atento e bem
informado, já que a prevenção sempre é o melhor remédio. Mas o que fazer após a picada?
Fotos Instituto Butantan – São Paulo - SP
Fotos Kenji Honda/Arquivo Aruanã.
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Jararaca
A imensa maioria dos acidentes ofídicos ocorre com as
serpentes do gênero Bothrops, que é
composto por mais de 30 variedades de cobras: as populares jararacas. Conhecida
também como caiçaca, jararacuçu, cotiara, cruzeira, urutu, jararaca-do-rabo-branco,
surucucurana, etc., a jararaca é responsável por 88% dos acidentes registrados
em todo o país, contra 9% causados por cascavéis e apenas 3% causados por
surucucus e corais verdadeiras. Vamos nos ater aqui principalmente às
jararacas, já que sua distribuição geográfica abrange todo o território
nacional e seus habitats e locais de incidência (são encontradas principalmente
em beira de rios, dentro d’água, penduradas em árvores ou enterradas) muitas
vezes recebem a visita dos pescadores amadores. As serpentes do gênero Brothrops apresentam cores e desenhos
diferentes pelo corpo, indo do verde ao negro. Seu tamanho pode variar, quando
adultas. Entre 40 cm e 2 m de comprimento. É útil ter conhecimento de algumas
regras simples que permitem fazer a diferenciação entre cobras peçonhentas
(venenosas) e não peçonhentas. Se a cobra apresenta anéis coloridos em qualquer
combinação de cores, é possível que se trate de uma coral verdadeira, que deve
ser considerada como venenosa.
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Paciente após quatro dias de internação no Hospital Vital
Brasil, tendo buscado socorro após decorridas
mais de 8 horas do momento do acidente. A picada provavelmente foi dada por uma
jararaca adulta. Nota-se alguns pontos necrosados no pé, porém o edema local já
começa a regredir. Segundo a Drª Hui, este é um caso de moderada gravidade.
À exceção da coral, as serpentes peçonhentas invariavelmente
apresentam fosseta loreal, ou seja, um pequeno buraco entre o olho e a narina
em cada lado da cabeça, que serve para que percebam as modificações de
temperatura à sua frente, permitindo que possam se movimentar e caçar à noite,
por exemplo. Se a cobra tiver um chocalho na ponta do rabo, sem dúvida é uma
cascavel. Se o rabo tem escamas arrepiadas e ponta de osso, trata-se de uma
surucucu-pico-de-jaca. Já uma cauda sem detalhes importantes é característica
das jararacas. Segundo a DrªFan Hui Wen, médica infectologista que ocupa a
chefia interina do Hospital Vital Brazil no Instituto Butantan, em São Paulo
(SP), na primeira meia hora após a picada da jararaca, já é visível o edema
(inchaço) que começa a se formar no local atingido. “O inchaço aumenta
progressivamente e podem ocorrer dores. Devido à ação do veneno, na região da
picada aparecem manchas arroxeadas, caracterizando as equimoses, que são
sangramentos subcutâneos com aspecto semelhante ao de hematomas comuns”.
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O local arroxeado na parte superior da perna mostra uma
região onde houve absorção do veneno, caracterizando uma equimose. Foram administradas
8 ampolas de soro neste caso. Caso mais leves podem ser resolvidos com a
aplicação de 4 ampolas, mas os caos mais graves necessitam de até 12 ampolas de
soro.
O envenenamento local instala-se nas primeiras horas após o
acidente, podendo evoluir para o envenenamento sistêmico, ou seja: a circulação
sanguínea absorve o veneno inoculado e passam a ocorrer eventuais sangramentos
em outras regiões do corpo. “É comum a ocorrência de hemorragias na gengiva.
Além disso, se a pessoa acidentada tiver tomado alguma injeção recentemente, o
local onde a agulha penetrou poderá começar a sangrar. Sangramentos mais
graves, como por exemplo, uma hemorragia no aparelho digestivo são mais difíceis
de ocorrer. É mais comum o sangramento de cor viva na urina. Se o acidentado
sofrer algum tipo de traumatismo na cabeça após a picada, isto pode ocasionar
um sangramento intracraniano, que pode levar ao “óbito”, observa a Drª Hui. Em
geral, não há perda de consciência, mas a circulação sanguínea altera-se muito
em relação às sua condições normais. O veneno inoculado pode acarretar
distúrbios de coagulação: o sangue fica incoagulável, dificultando o
estancamento de hemorragias. Óbitos ocorrem tardiamente, ainda assim somente
nos casos em que há complicações posteriores.
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A não observação da imobilidade que é recomendável ao
acidentado e a demora na busca de socorro favorecem um maior e mais rápido
alastramento do veneno no organismo. O ideal é começar o tratamento dentro das
primeiras três horas após a picada, sendo que, passadas seis horas, a peçonha
já terá se fixado aos órgãos-alvo, desencadeando assim o processo de lesão
tecidual. A Drª Hui explica: Aqui ocorre uma espécie de ‘efeito dominó’, pois
mesmo tendo sido neutralizado o veneno através da aplicação do soro, o processo
já foi desencadeado. Não adianta erguer a primeira pedrinha do dominó: o
impulso já foi dado e as outras fatalmente cairão. É necessário então ir
observando as reações do organismo para determinar a extensão do problema. Dependendo
da região atingida, podem ocorrer necroses, que exigem alguns dias até que
possamos precisar seguramente quais são as áreas realmente lesadas. Ao
contrário da panturrilha, os dedos, por exemplo, têm uma característica muito
menor de se expandir e suportar o inchaço, o que acaba favorecendo o rápido
aparecimento e evolução das gangrenas, devido ao sofrimento dos vasos
sanguíneos e morte dos tecidos do local.”
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.Caso socorrido 3 horas após a picada. A área atingida já
manifesta o edema e o arroxeamento característicos.
Outras complicações frequentes ocorrem em casos onde foi
grande a quantidade de veneno inoculada, além dos casos em que os procedimentos
de socorro foram inadequados, piorando as condições iniciais da vítima. Segundo
esclareceu a médica, “a serpente pica e solta rapidamente. Se ela conseguir dar
um golpe bem dado, com as duas presas, se for uma cobra adulta ou se não se
tiver alimentado recentemente (após uma refeição, a produção e a quantidade de
veneno, diminuem), a quantidade da substância venenosa inoculada será maior, e
quanto mais veneno, menor é o tempo que deve ser observado para o socorro a fim
de evitar as complicações. Procedimentos como garrotes (torniquetes) não devem
ser adotados, já que, se por um lado podem teoricamente impedir eu o veneno
inoculado se espalhe através da circulação para todo o organismo, por outro
lado favorecem uma maior concentração da peçonha na área atingida, o que pode
compromete-la seriamente, acelerando o agravamento das lesões locais e em casos
raros ocasionando uma eventual perda do membro atingido através da necessidade
de amputação.
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Caso socorrido no terceiro dia após a picada. O paciente
havia feito garrote. A região atingida mostra-se tomada por necrose
irreversível. Foi necessária a amputação.
A sucção no local da picada é totalmente ineficiente, pois a
inoculação do veneno através das presas da serpente assemelha-se à aplicação de
uma injeção subcutânea ou intramuscular, ou seja, não adianta “chupar” a região
atingida, já que não há como fazer a substância introduzida sair do organismo.
O mesmo pode ser dito a respeito de cortes e perfurações com a finalidade de
provocar sangramentos que teoricamente fariam com que o veneno “saísse” junto
com o sangue. É sempre necessário tomar o soro, que é aplicado por via
endovenosa na quantidade suficiente para cada caso, a critério médico.
SEQUELAS
Há pessoas que se queixam de dores de cabeça, enjôos e outros
males que atribuem a picadas de cobras ocorridas há anos. Outros afirmam que o
veneno das serpentes acarreta impotência sexual permanente. Na verdade, nada
disso tem base científica, cabendo mais na definição de “lendas”. Realmente pode
haver sequelas de acidentes ofídicos, sendo a mais triste a amputação de
membros (felizmente pouco frequentes hoje em dia) ou a incapacitação para o
trabalho devido à perda total ou parcial dos movimentos da região afetada.
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Caso socorrido entre 6 e 12 horas após a picada. Já há a
manifestação do envenenamento sistêmico. O edema já atinge uma área maior,
generalizando-se.
A Drª Hui explica que é mais comum ocorrer o “déficit de
função”: Se o individuo teve uma necrose que atingiu músculo ou tendões, perderá
imobilidade. Aqui no Hospital Vital Brazil, as necroses ocorrem em apenas 10%
dos casos. É a ação do veneno que acarreta tais danos, e não a perfuração pelas
presas das cobras. “Podem ocorrer também as chamadas infecções secundárias,
pois no ato da picada, a serpente, além de inocular o veneno, também introduz
no organismo da vítima os microorganismos que tem na boca, o que agrava o
quadro geral”. Não há lógica em se afirmar que existem danos causados pela
permanência de veneno no organismo após a cura do paciente, já que o veneno em
si e neutralizado rápida e totalmente após a administração do soro, no início
do tratamento. No entanto, é preciso observar o período de tempo necessário
para que o edema local desapareça. O paciente deve se manter em repouso durante
o prazo que for recomendado pelo médico.
PREVENÇÃO DE ACIDENTES
Mais de dois terços dos acidentes ocorrem na região do joelho
para baixo. O uso de botas reduz em 80% esse risco.
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O efeito do garrote: a região onde foi presa a circulação
concentrou maior quantidade de veneno, tendo sido visivelmente mais
prejudicada.
Além disso, é necessário redobrar os cuidados ao manusear
gravetos ou montes de folhas, por exemplo. Opte por realizar tais tarefas com o
auxilio de uma varinha ou galho. As serpentes são animais de sangue frio e
mantém-se sempre à temperatura ambiente procurando evitar a perda de umidade.
Assim elas se recolhem durante as horas mais quentes do dia e saem no início da
manhã e fim de tarde em busca de alimentos ou apenas para passear. Evite essas
oportunidades de encontrar-se com elas quando vocês estiverem compartilhando o
mesmo habitat. Em acampamentos, é recomendável fechar os carros e não deixar restos
de comida e lixo exposto. Além da agressão ao meio ambiente, esse procedimento
atrairá a vista de roedores, que são a base da alimentação das cobrar
venenosas. Elas naturalmente irão atrás deles. Nem sempre é aconselhável levar
soro antiofídico em suas incursões na natureza, devido às dificuldades de
armazenagem (deve ser mantido sob refrigeração constante) e aplicação – só um
profissional de saúde saberá determinar o tipo e a quantidade de soro
apropriado a cada caso.
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Caso socorrido aproximadamente 24 horas após a picada. Além
do edema característico, nota-se a presença de regiões necrosadas no dedo
anular. Em todos os casos fotografados, os acidentes foram ocasionados pelo
contato com jararacas
Não se esqueça de que existem serpentes não peçonhentas que
também picam, e se não há inoculação de veneno, o soro é desaconselhado, já que
contém anticorpos de cavalos, ou seja, proteínas estranhas ao organismo humano,
que pode manifestar alguma reação do tipo anafilático. Cada soro é específico
para um tipo de veneno. Se você não sabe determinar qual é o adequado, é
conveniente não arriscar. Se uma serpente lhe picar, o melhor é movimentar-se o
menos possível para retardar o alastramento do veneno na circulação e solicitar
que alguém busque auxílio rapidamente. Antes de sair para pescar ou acampar em
locais onde exista a possibilidade de um encontro com serpentes, informe-se
sobre o posto de atendimento médico mais próximo de onde você ficará. O tempo,
como você já sabe, é o principal fator determinante do sucesso na recuperação
de um acidente ofídico.
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Drª Fan Hui Wen
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EM
DEFESA DA SERPENTE PEÇONHENTA
Como todos os animais
na Natureza, as serpentes desempenham seu papel no ecossistema que integram,
alimentando-se de roedores como ratos, camundongos e preás. O uso indiscriminado
do espaço e do solo pelo homem com plantações, criações e moradias contribui
para aumentar o número de roedores, que também são atraídos pelo lixo das
regiões metropolitanas. Os desequilíbrios biológicos causados por inundações,
desmatamentos e queimadas faz com que as cobras, como outros animais nessas
circunstâncias, sejam obrigadas a mudar seus hábitos. Em tais ocasiões, elas
passam a buscar abrigo e proteção em casas, celeiros, etc. Não se pode mais matar
impunemente uma serpente só pelo fato de ser considerada repulsiva ou só porque
está viva. A principal finalidade do veneno que ela possui é garantir sua
própria defesa. Uma cobra não ataca um ser humano somente porque ele invade seu
habitat. Ela se limita a reagir às situações onde se sente em perigo. É
interessante notar que as serpentes venenosas são menos agressivas que as não
venenosas. Como animais silvestres que são, as serpentes têm direito à mesma
proteção legal que o restante de nossa fauna nativa. Pelo menos no papel. Se
nada na natureza sofresse a interferência negativa do homem, todas as espécies
viveriam em harmonia e perfeito equilíbrio. A realidade ainda não é assim
porque o homem segue relutando em entender a si mesmo como apenas mais uma
manifestação da própria natureza.
Reportagem: Paula Lopes
da Silva
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Revista Aruanã Ed:37 Publicada em 12/1993
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Conforme havia dito ao Antonio via telefone, eu venho acompanhando há uns anos, um grupo de biólogos e herpetólogos no facebook. O grupo prima pela ciência. São acurados no quesito identificação, há profissionais com 30 anos de carreira e entusiastas leigos como eu. Apesar de ser leigo, sei ler, interpretar e aprender com o que é dito lá, e já os acompanho há pelo menos 5 anos. Posso dizer que do texto da Paula é irretocável. Apresenta de forma clara o acidente ofídico em si. Passa longe de crendices populares e descreve de maneira didática o que deve ser feito em caso de uma ocorrência. Irretocável. Parabéns.
ResponderExcluirOlá Kareka: Obrigado pelo comentário e, em nome da Paula minha filha te agradeço. Essa matéria foi resultado de algumas idas ao Instituto Butantã. Como é sabido o administrador de um blog, consegue ve-lo nos mínimos detalhes. Achei estranho que nos comentários, "aos pés da postagem" ninguém se manifestou com alguma observação. Fiquei então na dúvida: ou todos os pescadores sabem como se prevenir desses acidentes, ou ninguém entendeu nada do que passamos. Porém, nos nossos meios de ver o blog, constamos que mais de 56 pessoas o leram. Para mim, é sempre bom responder nos comentários, já que abordamos um pouco mais o assunto. Por exemplo: nos atuais pesque pague, que são muitos espalhados pelo Brasil, nós temos um local propício ao aparecimento de cobras. Digo isso já que fui informado por um dono de uma grande loja, que consultado por mim de como estava se virando com o fechamento do comércio, disse-me que “graças a Deus - palavras dele – existem os pesque pague”, pois segundo ele ainda, são esses pescadores que estão sustentando suas vendas. O que quero explicar e queria saber, é se os donos desses pesqueiros têm essa preocupação de verificar a existência de cobras em sua propriedade. Isto porque é nesses locais, que um detalhe se torna perigoso, já que servem comida aos freqüentadores. Ora, se há comida, sobram restos que vão para o lixo. Se há lixo, existem com certeza ratos ou outro roedores. Assim sendo está formado o quadro perigoso, já que os ratos são o alimento das cobras, e isso fica a um passo de um acidente ofídico. O que fazer após o acidente foi a preocupação da Aruanã, na pauta escrita pela Paula, para que o ferido, seja transportado o mais rapidamente ao Butantã e como faze-lo. Enfim, portanto, seu comentário foi muito proveitoso por mim, como editor. Há detalhes quer não foi dito pela Paula, porque fiz outra matéria lá no hospital e ela não estava presente. Só Deus sabe o que vi, ouvi e senti, principalmente nos cheiros dos pacientes. Enfim não vou me alongar mais e se houver por lá, algum comentário, terei prazer em responder. Mais uma vez, obrigado.
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