Uma nova espécie está habitando as águas do Pantanal. As
informações sobre o tucunaré “pantaneiro” são as mais desencontradas possíveis.
Fomos ao rio Piqueri saber do tucunaré e realizar mais um roteiro de pesca para
o pescador amador. Confira.
Para se chegar rio Piqueri, vamos tomar por base a cidade de
Cuiabá (MT). Partindo-se de São Paulo, são 1.680 km, via Três Lagoas, em
estrada totalmente pavimentada. Em Cuiabá, vamos andar mais 91 km, também em
estrada pavimentada, para então chegarmos á cidade de Poconé. É exatamente desse ponto em
diante que começa um trajeto que pode ser considerado como uma verdadeira
aventura, pois nos 144 km que nos separam de Porto Jofre, às margens do rio São
Lourenço, nossa parada final, a paisagem e a vida selvagem estão presentes
durante todo o trajeto. Em todo o percurso vamos encontrar uma estrada de terra
muito bem cascalhada, mas que deve ser percorrida com cuidado, procurando não
ultrapassar os 50 km/h. Essa estrada, aliás como todas no Pantanal, foi
construída da seguinte forma: tirou-se terra dos dois lados da estrada, o que
terminou por formar um aterro de mais ou menos 1 metro de altura, que passou
então a ser o leito da nova estrada. Ao seu lado restaram os buracos de onde a
terra foi extraída, que viraram extensas lagoas, com muita vida selvagem
girando em torno delas.
São peixes, aves e animais que hoje habitam essas lagoas.
Pois bem. Estamos na estrada e no máximo a 50 km/h, e devagar, lá vamos nós até
o destino final atravessando exatamente 129 pontes de madeira sem acostamento,
mas que são uma verdadeira maravilha, tal é a limpidez das águas. Pode-se até
ver piraputangas... e pesca-las. Outros habitantes dos arredores dessa estrada
são as capivaras e os jacarés. As primeiras em bandos de 10 ou mais indivíduos,
e os jacarés, dormitando ao sol, nos fazem brecar o carro e até buzinar para
que saiam do meio da estrada. Alguns, inclusive, nos obrigaram a descer do
carro e, claro com cautela, espantá-los para que pudéssemos seguir viagem. Em
nossa companhia estavam o Wilson Feitosa, proprietário da Pousada Santa Maria e
o Rogério Gullich, do Hotel Diplomata em Cuiabá. Essa viagem de Poconé até o
São Lourenço (Porto Jofre) é muito bonita apesar de cansativa. Durante o
trajeto vimos cervos, aranquãs, mutuns, jacutingas, araras, tucanos, papagaios,
tuiuiús e muitos jacarés. Finalmente, após 9 horas de viagem, chegamos a Porto
Jofre, às margens do São Lourenço.
Começamos por pescar dourados, que nesse rio estão nas
galhadas afundadas onde, com a força das águas, formam-se corredeiras. Fisgamos
aproximadamente 8 peixes, todos do tamanho limite. Fomos pescando e subindo, já
que nossa meta eram as baías, onde estavam os tucunarés. Para se chegar à
primeira baía, gasta-se com motor 25 HP cerca de 2 horas. Como referência,
anotamos a Fazenda Mangueiral, que fica à esquerda de quem sobe o rio. São
cerca de 65 km até a primeira baía, de nome “Boca do Baguari”. Pescamos ainda
em mais duas, lá conhecidas como Santa Mônica e Poleiro. A curiosidade desse
trecho foi ver uma onça-preta enorme atravessando a nado o Piqueri. Entramos na
primeira baía e aqui começou a dar um “revertério” na nossa cabeça, já que
largamos o material de dourado e passamos a um material mais leve, iscas
artificiais menores e linha bitola 0.35 mm. Demos os primeiros lances e o
resultado não se fez esperar: um tucunaré azul, de mais de 1 kg, estava preso
em nossa isca. Foi realmente engraçado estar no Pantanal, em rio do Pantanal, e
fisgar um tucunaré. É demais para a cabeça de qualquer um. Passamos boa parte
da manhã e início da tarde às voltas com os “intrusos” do Pantanal.
Fisgamos aproximadamente 30 peixes, variando seu peso entre 1
e 4 kg. Nossa informação é que existe tucunaré para ninguém botar defeito,
aliás, só vimos pescaria com tanto peixe assim no Rio Negro e no rio Araguaia,
e até nos bons tempos de Itumbiara. No meio da pescaria, começamos a lembrar de
como o tucunaré chegou ao Pantanal. A história verdadeira diz que um fazendeiro
da região do rio Itiquira, possuía um lago enorme em sua fazenda. Como era fá
do tucunaré, levou alguns alevinos para essa lagoa e o peixe se adaptou muito
bem. Com a cheia de 1976, essa lagoa transbordou, levando então os peixes para
o rio Itiquira. Desde essa época vem descendo, já estando agora no rio Piqueri,
e queira Deus que venha para o São Lourenço abaixo e chegue logo no rio
Paraguai. Muita bobagem sobre o tucunaré no Pantanal tem sido dita por pessoas
que não entendem do assunto, como por exemplo, que ele iria acabar com os
peixes da região. Isso realmente é “conversa para boi dormir”, ou então de quem
quer se autopromover. Nós da Aruanã constatamos in loco que todas as espécies
estão juntas e sobrevivendo normalmente.
Mas fomos mais longe, buscando também a opinião do Prof. Dr.
Heraldo A. Britski, considerado umas das maiores autoridades mundiais sobre
peixes de água doce brasileiros. O leitor poderá ler ao final da matéria a
opinião desse cientista. Mas outra grande e boa surpresa estava reservada a nós
no Piqueri. Nas entradas das baías, enquanto pescávamos tucunarés mais para
dentro, víamos, vez por outra, peixes fazendo evoluções na superfície da água.
Pensando tratar-se de tucunarés, nos aproximamos com o barco e demos alguns
lances com iscas de superfície. Como não houve ação nessas iscas, resolvemos
usar iscas de meia-água e corricar no local, por intermédio de arremessos. Não
deu outra. Logo um peixe fisgou e após uma boa e demorada briga, soubemos “quem”
era: um pacu. Aliás pegamos dois em seguida. Pacu fisgado em isca artificial –
na época – foi para nós, velhos conhecedores do Pantanal, uma grande surpresa.
A isca usada na pesca do pacu foi uma Rapala Jointed (articulada). À tarde,
voltamos para a Pousada. No dia seguinte fomos novamente ao Piqueri, e desta
vez atrás dos dourados e pintados.
Com os dourados tivemos sucesso novamente, chegando mesmo a
fisgar dois em uma só isca artificial, uma Red Fin 900. Perdemos os dois. Em um
poço do rio, os companheiros fisgaram um pintado de mais de 20 kg usando como
isca um piau três pintas. Havia vários pescadores profissionais pescando de
linhada e todos eles estavam com pintados enormes dentro de suas canoas. No
ultimo dia, dedicados à pesca de pacu na batida, usamos como isca o tucum e uma
fruta da época, o cajá. Essa fruta de cor amarela apresenta-se em várias árvores
à beira do rio, o que já era uma boa indicação de isca. Lá no São Lourenço, os
piloteiros chamam-na de “acaiá”. Ai está portanto mais um roteiro, desta feita
no rio Piqueri, com seus maravilhosos tucunarés. Agradecemos ao Wilson Feitosa
e Reinaldo dos Santos, da Pousada Santa Maria, e ao Rogério Gullich, do Hotel
Diplomata em Cuiabá. Muito obrigados a todos. E para quem quiser contatar a
Pousada Santa Maria, para informações e reservas, os telefones são: (011)
791-1265 e 414-6564, em São Paulo. (NR: confirmar esses tels. atualmente).
INFORMAÇÃO
À Revista
Aruanã: Tendo em conta a solicitação a respeito da proliferação do tucunaré na
região do Pantanal, fato que não pude observar pessoalmente, mas que tenho
tomado conhecimento através de diferentes informações, devo manifestar o
seguinte: Não acredito que “o tucunaré vai acabar com os outros peixes do
Pantanal como se tem dito, pensando que esse peixe seja uma praga que deverá
dizimar as demais espécies. Se isso fosse correto, caberia por perguntar: “De
que se alimentará o tucunaré depois que dizimar outras espécies ou depois que
seu número for maior que o das demais espécies? Tem ocorrido com certa
frequência que a espécie introduzida em outro sistema hídrico pode,
inicialmente proliferar rapidamente ao encontrar um nicho ecológico não
ocupado, exercendo, no caso de peixe de hábitos carnívoros como o tucunaré, uma
predação sobre espécies que não criaram defesas contra esse predador.
Entretanto, após esse aumento inicial às vezes explosivo, ocorre uma deplecção
progressiva nas populações da espécie introduzida até ocorrer o equilíbrio com
as demais. Essa é a tendência natural observada.
Citarei apenas um exemplo que ilustra esse
fato. Na década de 50 o dourado (Salminus maxillosus) foi introduzido na bacia
do rio Paraíba do Sul, Estado de São Paulo, onde anteriormente não ocorria, e
teve um desenvolvimento explosivo, naquela bacia. Constituía-se, então, na
grande atração dos pescadores daquele vale. Hoje, passado 30 a 40 anos, é muito
difícil capturar um dourado naquele rio. É isso, que presumo, acontecerá com o
tucunaré do Pantanal. Apesar dessa minha suposição, que devo categoricamente
manifestar que ela não significa uma aprovação ao transplante indiscriminado de
espécies de um sistema para outros; pelo contrário, penso que tais atitudes
devem ser enfaticamente condenadas, pois introduções de espécies exóticas
sempre representam uma desestabilização maior ou menor das comunidades naturais
e só devem efetivar-se após um estudo prévio que possa determinar suas
consequências para as populações nativas.
Prof. Dr.
Heraldo A Britski
Museu de
Zoologia da Universidade de São Paulo – SP
Revista Aruanã Ed. 39 publicada em abril de 1994
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Local maravilhoso, Toninho, tive o privilégio de conhecê-lo e pescar nele.
ResponderExcluirMeu bom amigo Marcão: por onde é que nós, dinossauros da pesca não andamos neste nosso país? E mais, uma pena que as novas gerações, talvez não tenham a oportunidade de ver o que vimos em nossas andanças. Abraço
ResponderExcluirEm qual época do ano foi essa viagem?
ResponderExcluirMeireles Sniper: A publicação se deu em abril de 1994. Normalmente, quando íamos fazer uma reportagem, seja ela qual fosse, ela sairia na próxima edição da Revista Aruanã. Como essa que você pergunta é a edição 39, com certeza a pescaria/reportagem aconteceu em fevereiro/março do mesmo ano. Abraço e obrigado pela sua participação.
ResponderExcluirOlá sou filha do wilson feitosa
ResponderExcluirOlá Luiza. É um prazer imenso ter contato com você, já que por certo irá me trazer notícias de seu pai, um bom amigo, do qual não tenho tido nenhum contato. Caso queira, pode entrar em contato em meu email, pois as informações serão mais rápidas do que por aqui. Ok? Fraterno abraço. Meu email - toninho.jorn@gmail.com
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