segunda-feira, 23 de março de 2020

É ÉPOCA DE - CAÇÃO








Em todos os oceanos do planeta, contam-se mais de 350 espécies diferentes de cação. Em nossas praias, o período que se estende de abril a setembro é sem dúvida a época em que os cações “encostam”. Vamos conhece-los melhor.


 O perigo dos dentes

Se fôssemos fazer uma descrição científica das várias espécies de cação, diríamos que pertencem, principalmente, às seguintes famílias: Isuridae, Carcharhiinidae, Carcharriidae e Sphyrnidae. Essas famílias englobam todos os indivíduos que comumente nadam pelo litoral brasileiro e são conhecidos pelos nomes vulgares de martelo, tigre, branco, viola, mangona, tintureira, etc. Um fato bastante interessante é a confusão entre as denominações “cação” e “tubarão” que a bem da verdade, designam os mesmos peixes. Aliás, certa vez um pescador caiçara diferenciou-os assim: “quando é cação, nóis come ele; quando é tubarão ele come nóis”. Muitas vezes a sabedoria popular é surpreendente, e a despeito da simplicidade contida nessa afirmação, pode-se dizer que ela é correta, ou no mínimo aproxima-se bastante da verdade. Como distinguir peixes que chegam facilmente a 200 quilos, por exemplo? 

Filé maneira correta de isca-lo

E isso considerando só as espécies mais comuns em nosso litoral, já que se formos consultar livros, vamos descobrir que existem certos exemplares que atingem com facilidade 1.000 quilos e medem mais de 5 metros de comprimento. Mas vamos nos deter na análise dos cações (esqueçamos o nome tubarão) que estão ao alcance dos nossos anzóis. Comecemos pelos dentes, que nas maxilas e mandíbulas encontram-se dispostos em até 4 ou 5 séries, dependendo da espécie. Desde já, essa particularidade mostra ao pescador amador a obrigatoriedade do uso de encastoados de aço nos anzóis. Uma outra curiosidade está no fato do cação, com seu olfato apurado, ser capaz de distinguir partículas de sangue na água numa proporção de 0,6 parte por milhão. Além disso, com seus dois lobos olfativos, consegue também sentir o cheiro do alimento mesmo a 400 metros de distância. Aqui temos outra boa dica, pois sabendo disso podemos, durante nossas pescarias de praia, fazer cevas usando restos de peixes e outros organismos do mar. 

Cação de 1,5m

Para obter melhores resultados na utilização desse tipo de ceva, recomendamos passar por uma peixaria e conseguir lá tudo o que for resto de peixe: cabeça, barrigada, couro, etc. Devemos tomar alguns cuidados para transportar essa ceva até o local da pescaria, acondicionando-a em sacos plásticos resistentes e sem furos. Isto porque se a ceva vazar dentro do carro, o mau cheiro resultante será de tal forma perene e “inesquecível” que não restará outra alternativa ao pescador além de vender o carro. Pois bem. Quando chegar na praia, tire a ceva do saco plástico e coloque-a em um saco de ráfia, tendo a preocupação de colocar também uma pedra pesada dentro dele, a fim de evitar que a água o leve para longe. Amarre a boca deste saco com um fio grosso de 3 ou 4 metros de comprimento e na ponta do fio amarre uma boia ou um simples pedaço de isopor, que servirá como uma referência visual. Pegue esse saco, leve-o até o segundo ou terceiro canal da praia e deixe-o dentro da água. 

Pequeno cação

Em todo nosso litoral, normalmente a correnteza segue no sentido norte-sul, ou seja, olhando-se para o mar, da esquerda para a direita. Como a boia serve para a localização da ceva, pesque sempre à direita dela, mais ou menos a uma distância de 30 metros. Observe que essa ceva proporciona ótimos resultados também para espécies de menor porte. Prepare uma vara boa, firme e resistente preferencialmente de categoria pesada na modalidade de praia. Use molinete ou carretilha grande, onde caibam, por exemplo, 500 metros de linha cuja opção de bitola pode variar entre 0.30 e 0.50mm, a critério do pescador. (NR: o multifilamento hoje existente no mercado mudará o diâmetro do fio). Faça um arranque de linha 0.60mm, medindo mais ou menos 20 metros e um chicote de 1.2 metros com linha 0.90mm. As pernadas dos anzóis devem ser de aço e os melhores serão os de tamanho entre 5/0 e 7/0, podendo-se utilizar um ou dois.

Detalhe 

A propósito: a chumbada deve ser do tipo pirâmide ou aranha, com peso variando de acordo com a correnteza. As iscas – e aqui vai outra dica importante – devem ser peixes obtidos na própria praia. Lembre-se que você também estará pescando outras espécies. Assim que fisgar uma betara, um parati barbudo, um roncador ou uma corvina, por exemplo, tire um filé de cada lado do peixe e isque-o nos anzóis do cação. Uma boa maneira de fisgar esse filé é introduzir-lhes o anzol na parte mais grossa, atravessando-os.  A preocupação de esconder a ponta do anzol é totalmente desnecessária, porém você deve assegurar-se de que a isca esteja firmemente fixada. Para isso amarre com Elastricot (fio plástico bem fino). O resto do filé vai ficar solto, “nadando” ao sabor da correnteza, parecendo um “rabo” de peixe. Jogue então a isca bem no meio do canal onde está a ceva, coloque a vara no fincador, regule bem leve a fricção do molinete/carretilha e deixe-a na espera. 

Iscas de praia

A partir daí é só aguardar. Aproveite para divertir-se pescando peixes menores com outra vara e não se preocupe em demasia, pois quando o cação fisgar, inevitavelmente você vai notar, já que a vara vai dobrar até a metade e a fricção do equipamento vai “cantar”.  Não tenha pressa. Lembre-se de que você mesmo procurou esse encontro. E prepare-se: dependendo do tamanho do peixe, vai haver uma briga por um par de horas. No momento em que é fisgado, o cação costuma dar uma corrida violenta, às vezes percorrendo até 300 metros, sempre em frente, sem parar. Após essa corrida, já com o peso da linha e da fricção, ele vai correr paralelamente à praia e é nessa hora que deve-se começar a recolher a linha. Nesse ponto ele costuma parar e chega até a vir de encontro do pescador, tracionado que está pela linha. Mais uma ou duas corridas, que tanto podem ser em frente como em paralelo, e ele começa a se entregar. 

O encontro final

Esse é o momento em que é necessário redobrar os cuidados, pois para pegar o peixe com segurança vamos precisar de um bom bicheiro, cujo comprimento do cabo deve ser proporcional ao tamanho do cação. Se o peixe tiver até um metro ou pouco mais, traga-o bem para o raso e pegue-o pelo rabo com as mãos. De qualquer maneira, tome muito cuidado: ele vira rápido e poderá morder. Lembre-se: os dentes pontiagudos são perigosos, mas também fazem parte do encanto dessa espécie. Pronto, o peixe é seu. E o que é melhor: foi uma briga boa e limpa, pois você o pescou esportivamente. Apenas mais duas observações finais. Primeira: os cações às vezes nadam em cardumes, sendo possível fisgar-se mais de um individuo em pouco tempo na mesma pescaria. A segunda é que haverá ocasiões em que apesar de termos a “certeza” de haver fisgado um cação, veremos no final das contas que tratava-se de uma arraia. Observe bem, quando for arraia você vai perceber logo, já que esse peixe, após uma breve briga, fica parado no fundo como se estivesse enroscado. Boa pescaria na melhor época dos cações.

 Revista Aruana Ed:56 Publicada em 04/1997

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